Em 2017, último ano do ciclo de
seca do nordeste, pude perceber que em Teresina os dias normais do chamado
B-R-O-Bró, de agosto e setembro até dezembro, não chovia, como esperado no
verão nordestino. Mas aos domingos acontecia sempre de chover ou o céu ficar
nublado… Até 2020, continuei percebendo esta regularidade tendencial: mais ou
menos no domingo, como sábado à noite ou segunda de madrugada, ou chuva ou
nuvens carregadas. Então passei a considerar uma lei do microclima teresinense
que esta regularidade ocorra.
Mas uma pergunta permanece: qual
a explicação da lei, do fenomenal? Chagamos à seguinte hipótese: durante o meio
da semana, há emissão enorme de poluentes e há também grande fluxo de pessoas,
logo a pressão do ar aqui aumenta, servindo de barreira à entrada de ares e
como se transbordasse o ar da cidade para seus arredores; já no final de semana,
o fluxo de automóveis cai abruptamente e ao mesmo tempo há lavagem de carros,
casas e roupas que tende a evaporar água e acrescer a umidade – a pressão do
ar cai em relação ao do meio da semana, então ocorre algo semelhante a um funil
ao atrair ar da mata circulante à cidade.
Por meteorologia, é possível
avaliar se a hipótese é correta. Pode
ser que a pressão do ar não seja alterada ao ponto de ser menor que ao redor da
cidade, sendo o bastante para manter a umidade produzida dentro do espaço
urbano. Fica a proposta de pesquisa ao leitor interessado.
Destacamos que um feriado no dia
de sexta-feira tende a antecipar o céu nublado ou a chuva para sábado, principalmente durante a noite, ou domingo mais cedo. Outro aspecto é que também no inverno mais ou menos no domingo, como probabilidade alta, é o dia em que certamente choverá. Esses elementos também foram verificados pela minha observação, o que
reforça o efeito dos ritmos da cidade nesta lei.
Como em todo sistema complexo dinâmico, a lei se revela como tendência e por aproximação probabilística. A regularidade é observada dentro de uma margem temporal de acontecimento.
A mãe aparece no instante em que
a plateia grita “Satã, Satã!” – quem sempre? E era quase impossível explicarmos
o papel ridículo daquela personagem, o quanto era uma farsa tosca adorada por
multidões, enquanto os verdadeiros heróis estavam anônimos (!). Tentar explicar
isto a uma adulta religiosa apenas pioraria a situação e perderíamos o fim do episódio…
Pois está escrito que não deveremos adorar a Satanás, aquele farsante.
Pois bem, gokuístas de todo o
mundo, tudo indica que a Bíblia – sei que isso chamou vossas atenções, muito –
é inspiração desta saga e do protagonista. Akira Toriyama, criador do anime,
deve ter tido o mesmo deslumbramento diante de mitologia tão exótica e
criativa, a cristã, como nós frente às lendas orientais (Os Cavaleiros do
Zodíaco são exemplo do fascínio causado pelos símbolos do ocidente).
Mas vamos, agora, direto ao
assunto; diz a palavra:
Respondeu Jesus: O
meu reino não é deste mundo; se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os
meus servos, para que eu não fosse entregue aos judeus; mas agora o meu reino
não é daqui.
João 18:36
Todos sabemos que Goku pertence à
outra raça, alienígena, Saiyajin.
Relembremos neste vídeo (encontrei em espanhol) do episódio zero, uma
produção especial sobre a origem da história:
Reassistindo o primeiro episódio,
o um, obtive outra pista:
Logo após a cena, a narrativa de
fato começa, pois Goku encontra a Bulma. Este é o símbolo do cristianismo e,
entre outras religiões, do catolicismo. Daí místicos tiram a ideia de que
vivemos a era de peixes e estamos indo para a de aquário, que é outra questão
fora deste artigo. Ali estava Kakaroto, inspirado na figura de Jesus, pescando,
até que…
Alguém poderá perguntar: Há mais
evidências? Sim, há algumas: sete esferas do dragão.
No primeiro capítulo do
Apocalipse, lemos:
E ele tinha na sua
[mão] destra sete estrelas; e da sua boca saía uma aguda espada de dois fios; e
o seu rosto era como o sol, quando na sua força resplandece.
Apocalipse 1:16
Sei que a música de abertura soou nos ouvidos de quem leu a
passagem acima, o que nos leva a este outra imagem tão mal interpretada:
Mata a saudade:
Vamos a outro versículo, famoso entre os memes:
Então, se observará o
Filho do homem vindo numa nuvem, com poder e portentosa glória.
Lucas 21:27
Sabe-se que Goku ganhou um ótimo presente do Mestre Kame:
Quem já desejou ter uma nuvem passageira, nuvem voadora, só
para si?
Se avançou neste artigo, parabéns, ó guerreiro, que vamos descer
fundo na questão; temos mais três elementos comprovadores desta tese. Olhem
este ser desagradável e estiloso:
Este inseto (! – sei o que ouviu!) tem correspondente
bíblico:
E o quinto anjo tocou
a sua trombeta, e vi uma estrela que do céu caiu na terra; e foi-lhe dada a
chave do poço do abismo.
E abriu o poço do abismo,
e subiu fumaça do poço, como a fumaça de uma grande fornalha, e com a fumaça do
poço escureceu-se o sol e o ar.
E da fumaça vieram
gafanhotos sobre a terra; e foi-lhes dado poder, como o poder que têm os
escorpiões da terra.
E foi-lhes dito que
não fizessem dano à erva da terra, nem a verdura alguma, nem a árvore alguma,
mas somente aos homens que não têm nas suas testas o selo de Deus.
Apocalipse 9:1-4
E o parecer dos
gafanhotos era semelhante ao de cavalos aparelhados para a guerra; e sobre as
suas cabeças havia umas como coroas semelhantes ao ouro; e os seus rostos eram
como rostos de homens.
E tinham cabelos como
cabelos de mulheres, e os seus dentes eram como de leões.
E tinham couraças
como couraças de ferro; e o ruído das suas asas era como o ruído de carros,
quando muitos cavalos correm ao combate.
E tinham caudas
semelhantes às dos escorpiões, e aguilhões nas suas caudas; e o seu poder era
para danificar os homens por cinco meses.
E tinham sobre si
rei, o anjo do abismo; em hebreu era o seu nome Abadom, e em grego Apoliom.
Passado é já um ai;
eis que depois disso vêm ainda dois ais.
Apocalipse 9:7-12
Qualquer semelhança é semelhança. Por exemplo: o que “caudas
semelhantes às dos escorpiões, e aguilhões nas suas caudas” tem a ver com o
Cell, de Dragon Ball Z?
Isto é um aguilhão:
Isto é o Cell na primeira forma, com fome de energia alheia:
E: quando ocorre a história, em que época? Pouco depois da
morte de Cristo e pouco depois de escrito o Livro do Apocalipse, aquele que
anunciara o retorno próximo do Filho de Deus (eu sei -- isto é foda, foda!) :
“Ainda que sua cronologia dita que transcorrem os anos 749
d.C ao início da série, são encontrados diversos avanços tecnológicos. Os
habitantes nativos do Dragon World podem ser classificados em três grupos: Humanos,
Humanoides e Criaturas. Politicamente,
encontra-se sob uma Monarquia absoluta mundial, e se encontra divido
geograficamente em 43 zonas. Excetuando sua cronologia, o calendário tem as
mesmas divisões e longitude que o Calendário Gregoriano. Toriyama concebeu o
universo de seu trabalho como uma "grande esfera" dividida em dois
setores: na parte inferior habitam todos os seres vivos ( "terra dos
vivos"), enquanto a parte superior é o "além" (あの世,
Anoyo?), o lugar para onde se dirige tal personagem depois de sua morte e lar
de alguns espíritos e divindades. Entre os dois setores está o Inferno (地獄
Jigoku?), destino daqueles seres do mal quando morrem. Quatro quadrantes podem
ser distinguidos no reino dos vivos, cada um dos quais é governado por um ser
divino conhecido como Kaioshin (界王・界王神, Kaio Shin?). Por sua vez,
existem outros seres mais poderosos que supervisionam os Kaioshins, considerado
como "deuses da criação". Em contraste, existem os "deuses de
destruição, que tem o objetivo de exterminar a vida, a fim de garantir o
equilíbrio no universo. Existem 12 de universos; Terra é parte sétimo e designada como "Planeta 4032-877",
localizada na região nordeste do cosmos. É regida pelo deus Kami (神様?)—criador das Esferas do Dragão terrestres—, que é
supervisionado pelo Kaioh do Norte.” (Wiki. Grifos meus.)
Ao ver estas informações, o
cérebro implodiu por tamanha quantidade de referências. O Capitão América
passaria mal, para alegria da Hidra (ou não, nessa bagunça da Marvel…). Penso
que a ideia de um governo mundial totalitário – Roma? EUA? Google-Skynet? Freeza?
– já todos sabem de citação na Bíblia.
Ao que parece, a principal
inspiração cristã vem da Igreja Messiânica Mundial, fundada no Japão, que parte
da ideia de energia nas mãos como centro de sua misticidade, de sua atuação:
Johrei: Em japonês, “purificar o
espírito”. É um método de canalização da luz divina criado pelo fundador da
Igreja Messiânica Mundial. Para ministrá-lo é preciso ter o Ohikari, medalha
sagrada que simboliza a conexão daquela pessoa com Deus. O ministrante
direciona a palma de uma das mãos para o receptor por 10 a 30 minutos, primeiro
na parte frontal, depois em suas costas. Não é necessário ser filiado à Igreja
Messiânica para receber essa energia.[1]
É isto?:
Também cura o mal, de outro modo…
Enfim, o jeito bom, bobo e
altruísta de Goku parece com a de Jesus e, provável, seria de seu agrado. Pelo
menos, segue a máxima do filósofo judeu: "Eu lhes asseguro que, a não ser
que vocês se convertam e se tornem como crianças, jamais entrarão no Reino dos
céus” – Mateus 18:3.
Rompemos o primeiro selo do apocalipse.
A arte tende, cada vez mais, a tornar-se um produto enlatado. Como toda
produção industrial pós-fordista (frase de efeito!), é questão de facilitar o
caminho. A literatura aparece pré-cozida, instantânea, padronizada, embalada.
Quanto mais fácil a digestão, melhor!
Cursos de escrita criativa, blogs
manualísticos (certo, é um neologismo), livros universais da técnica literária:
tudo programado para deixar a leitura fácil e comercial. "Aqui é
assim!", "Ali é assado!", "Acolá faça isto!". Existe
forma mais horrível de matar um escritor? Torna-se um zumbi-escrevente.
Surgiu o modo de produção: a cópia da
cópia da cópia da (quem começou o ciclo?). Causar empatia? Diga que a
personagem lutará pela família. Identificação com o/a protagonista? Descreva apenas
os detalhes e - não esqueça - coloque algo bizarro (um relógio do Mickey, quem
sabe). Como estruturar? A Jornada do Herói, lógico (óbvio?). Pare a mania de
descrever cenários! Há orientação robótica nas fábricas do mundo e há
escritores adestrados.
É objeto passivo o escritor alegre por
seguir fórmulas pretensamente universais (se doeu, ótimo: há esperança). Na
filosofia chama-se "coisificação" ou alienação do sujeito. A essência
do Homo Sapiens - segundo esta concepção materialista - é sua capacidade
criativa. Quem nega o pensamento, a criatividade e a individualidade - para
seguir leis estéticas do mercado - é qualquer coisa que não um humano
(quase-humano, talvez).
A arte existe por necessitarmos dela.
Ao matarmos a arte, morremos. O escritor tem - iniciamos a trama - uma linda
missão, a de ser o investigador. Procure uma forma nova de dizer, uma estética
nova, um novo conteúdo, um ponto de vista inédito. Investigue! Reafirme a tua
humanidade em um mundo coisificante, bruto.
Somos, os três, o mutualismo
totalizante. A vida inexiste sem a arte que inexiste sem nós que inexistimos
sem a arte que inexiste sem a vida. Estamos interligados em nível subatômico!
Sabe-se lá se, até aqui, o leitor-escritor
está convencido. Insisto um pouco mais ou quantas vezes preciso for. Imaginemos
que vamos nos dedicar a outra arte.
Estudaremos:
Escultor: 1. história das esculturas;
2. as diferentes técnicas; 3. acharemos o próprio rumo.
Pintor: 1. idem; 2. idem; 3. idem.
Ator: 1. idem; 2. idem 3. idem.
Músico: 1. idem; 2. idem; 3. idem.
(Etc.: idem; idem; idem.)
Por que - ó, Lúcifer, Anjo da Luz! -
seria diferente com a arte de escrever?
"Não há faculdade para escritor,
oras!", o antagonista imaginário responderá. A resposta é (na minha
opinião?):
1. Leia, mas leia de verdade.
Os grandes clássicos, os de prêmio
Nobel, as teorias, as filosofias.
2. Pratique, mas pratique de verdade.
Procure caminhos, descaminhos,
"aquele capítulo pode ter outro formato?".
3. Estude.
Quem sabe alcance, enfim, pelo menos, o
posto de escritor medíocre. Ler e escrever são invenções humanas; esqueçamos,
portanto, a falácia dos "talentos naturais".
4. Encontre-se.
Quem ganhou espaço na história da arte?
Quem abriu um caminho novo na mata (metáfora antiga e eterna!). O inconsciente,
o subconsciente e o ID farão o papel deles. Faça a tua.
As regras sequer merecem ser quebradas:
já são frágeis. Possuem utilidade para o primeiro passo e inúteis para o andar.
Mas, perguntemos, este texto, em si, é um conselho-regra? Invertamos. Tijolo -
qualquer coisa ou coisificado - precisa de parâmetros?
Liberdade de criação é tudo. Ser livre
é sê-lo (quero dizer: nem precisa escrever algo complicado para afirmar-se
enquanto autônomo). "Ah, mas sou livre para ser escravo!", resiste o
inimigo. Sobre a afirmação, duas dicas chaves-de-ouro:
1. Literatura é a arte de reescrever;
2. Vá se foder.
:: João Paulo da Síria, quase-escritor.
Não eleito - infelizmente - antes da hora. Defende a independência da arte
contra prisões ideológicas e mercadológicas.
Esta é uma das letras mais apaixonantes
da banda gaúcha. O "Muito prazer, meu nome é otário", um verso fora
do comum, ficou famoso desde o Acústico MTV.
Propomos ler os versos em duas camadas.
São duas visões que se complementam. Uma é a da história de Miguel Cervantes, o
"Dom Quixote", um decadente e quase-louco cavaleiro medieval.
Enfrentou Moinhos de Vento, achando que eram Dragões, com seu amigo Sancho
Pança. O viajante sonhador desejava ser como os heróis de seus livros. A obra espanhola fala da relação entre o ideal e o real. A segunda interpretação - a segunda camada - depende da vivência do Humberto, o compositor.
Esta música é do CD "Dançando No
Campo Minado". No livro "Pra Ser Sincero - 123 Variações do Mesmo
Tema", ele explica que a Guerra de Bush, o atentado às Torres Gêmeas e a
explosão de uma bomba perto de seu Hotel no Rio de Janeiro foram o gatilho para
as músicas e para o título.
Podemos somar a utopia do Dom Quixote
com a utopia - ou a falta dela - nos nossos dias. Vamos para a letra:
"Muito prazer, meu nome é otário
Vindo de outros tempos, mas sempre no
horário"
Os trabalhadores são considerados os
portadores do futuro nas utopias modernas (socialismo, anarquismo,
igualitarismo, etc.). Vistos como injustiçados pelas ações dos ricos, e sempre
disciplinados pelo trabalho (sempre no horário).
"Peixe fora d'água, borboletas no
aquário
Muito prazer, meu nome é otário
Na ponta dos cascos e fora do páreo
Puro sangue, puxando carroça"
É um complemento dos primeiros. Têm o
mesmo sentido. A comparação com um animal e com o transporte de Dom Quixote é o
sinal de sofrimento.
"Peixe fora d'água, borboletas no
aquário" e "fora do páreo" fala sobre estar fora das decisões da humanidade, do governo e da vida econômica ou social. A sensação de sufocamento do peixe e a prisão da borboleta, as localizações invertidas: sentimento do/no mundo.
"Um prazer cada vez mais raro
Aerodinâmica num tanque de guerra
Vaidades que a terra um dia há de comer
"Ás" de Espadas fora do
baralho
Grandes negócios, pequeno empresário
Muito prazer, me chamam de otário"
Aqui, os primeiros três versos reforçam
o que impulsionou o CD. Sabemos que o ricos não vão para o campo de batalha,
mas empurram toda a humanidade a uma catástrofe. A indústria do armamento, por
exemplo, precisa que as bombas sejam usadas para produzir... bombas.
Os outros três falam que o povo está
por fora do jogo, das decisões, por não ter dinheiro. Ao mesmo tempo vendem que
qualquer um pode ser rico - uma ilusão ou "grandes negócios...".
"Por amor às causas perdidas
Tudo bem, até pode ser
Que os dragões sejam moinhos de vento
Tudo bem, seja o que for
Seja por amor às causas perdidas"
Aqui voltamos às utopias igualitaristas
e a suas propostas de resolver o absurdo que é o mundo. Há um certo pessimismo já que estas utopias sofreram abalos na década de 1990 (por amor às causas perdidas). Mas também mostra a
necessidade de sonhar, apesar de tudo. Entre a esperança e o medo, os temíveis dragões podem ser, na verdade, quem sabe, apenas moinhos de vento.
"Por amor às causas perdidas
Tudo bem, até pode ser
Que os dragões sejam moinhos de vento
Muito prazer, ao seu dispor
Se for por amor às causas perdidas
Por amor às causas perdidas"
Reforça o anterior. O mais curioso é que estas utopias começaram a ressurgir na época do lançamento da canção.
Há uma relação interessante. Dom
Quixote comunica-se com Segunda Feira Blues I e II, música ao seu lado, do
mesmo CD. Na letra diz: "Onde estão os caras que diziam que a guerra ia
acabar, onde estão os caras que diziam que a maré ia virar" e "Onde
estão os caras que lutavam dia-a-dia sem perder a ternura jamais?" em uma
referência direta ao texto de Chê Guevara "É preciso endurecer, mas sem jamais perder a ternura".
Dom Quixote tem o sentimento das
utopias, dos sonhos, das revoluções. São as horas em que percebemos que o
mundo, tal como está, nos passa a sensação de otários e precisamos mudá-lo. Talvez sonhar seja um bom começo.
Dia desses tive contato com a matéria do The New York Times, 1991, fazendo o contrário da crítica tupiniquim: elogiou - e muito - a presença dos Engenheiros do Hawaii no Rock In Rio II. Todo fã pensa, de cara, rápido, os porquês diabos de algumas críticas nacionais. A lentidão perceptiva dos avaliadores brasileiros vem, entre tantas coisas, no argumento daqui, de um passado na música nacional: Rock café e leite ou, simplesmente: iê-iê...
No princípio era a Jovem Guarda. Um rock romântico, fofo, letras óbvias, rimas simples, erotismo quase inocente, musicalidade típica, iê-iê e tal. Era a fase inicial daquela novidade. Produziu material fraco, mas também - ainda bem! - toda uma geração genial, de Os Mutantes à Raul Seixas.
Mas veio, aí, a década de 1980, a terrível. Se o mundo não era mais o mesmo, por que o Rock deveria ser? O mínimo que ocorre a um som subversivo é evoluir-se, do simples ao complexo. Vieram as letras (muito) fodas do Legião Urbana, a poesia de Cazuza. MUDARAM o Rock brasileiro. Mas, ainda, fizeram uma forte ruptura parcial, incompleta. A total, completa - tam-tam! - está resumida e subjetivada em um ser humano: Humberto Gessinger. Engenheiros do Hawaii consolidou o que os "poetas do rock" iniciaram, a ruptura com o Rock iê-iê, café e leite.
Chega de solos de guitarra "mais ou menos"! Augusto Links, no dedilhar e nos acordes, mostra a racionalidade criativa! Chega de bateria mediana! A explosão emotiva de Carlos Maltz move a platéia! Chega de letras comestíveis, pré-cozidas! Humberto Gessinger leva, às composições, a sofisticação da MPB da década de 1970. Canta. Move. E ajuda a pensar. Falar de amor não é mais só escrever "eu te amo e linda". É dizer "tudo queimava e nada aquecia! E ela apareceu e parecia tão sozinha e parecia que era minha aquela solidão!".
Vai ter metáfora sim! Vai ter aliteração sim! Vai ter trocadilho sim! Vai ter citação literária sim! Vai ter jogo de sentidos sim, oras!
Rompendo o eixo Rio-São Paulo, das terras frias vieram três rapazes que só queriam fazer do jeito deles e foda-se.
A moda é bateria ativa? Faremos Terra de Gigantes só com o violão! A moda são as letras curtas? Infinita Highway! A moda é encher de sons e músicos? Trio já! Se é pra fazer bem feito, que seja do jeito do artista e pronto.
A crítica especializada e pedante não entendia. Meu Deus, como assim o público vai à loucura? Como assim um guri de 15 anos parece entender e sentir este som mais do que eu e meu prestígio e meu diploma?
Mais nunca, desde aquele dia, continuamos a mera sombra deformada da sonoridade internacional. Os "de Fé" descobriram o sabor novo, viciante.
Temos o Rappa, a Pitty, os Detonautas para consolidar a revolução. E assim se fez o novo testamento, ruptura-continuidade do Rock brasileiro, a nova aliança e o Papa é Pop. Que a nova geração seja autônoma e continue a criar e recriar!
O gaúcho respondeu, aos iluminados da "crítica crítica", por um meio épico, genial, original e aqui:
Como já disse antes, pretendo evitar o perfil guru, orientador. O espaço é para dividir (ou seria unir?) o que ando aprendendo. Metade sem querer e metade por curiosidade o artigo pode sair. Estudando o método na literatura e a dialética materialista surgiu a "fusão" dos conhecimentos.
Algo brevíssimo, direto, antes de ir direto ao assunto. Eis: O materialismo dialético procura descobrir como funciona os mecanismos da realidade, sua dinâmica, sua lógica, seu desenvolvimento; estabelece uma série de leis e categorias básicas para facilitar o trabalho científico. Uma introdução pode ser positiva.
Agora sim, como prometido, as oito dicas (não colocarei em ordem decrescente, oras, mania!):
1. Em toda totalidade o conflito é a lei e ele promove o movimento
1.1. Ou seja, pense em um bom conflito para tua história. Um apaixonado, um inevitável, tão forte que você se verá obrigado a caminhar o enredo por estradas que desconhecia;
1.2. Os opostos estão sempre, de alguma forma, interligados: o antagonista e o protagonista, a culpa do passado e o "ser correto" no presente, a vontade egoísta e a necessidade coletiva;
1.3. Por isso, é importante EVITAR personagens perfeitos, só com qualidades, incríveis em demasia. Soa falso, irreal;
1.4. Lembremos de colocar conflitos secundários. Do protagonista com o aliado ou consigo próprio; idem para o antagonista.
2. A matéria, a realidade, determina os hábitos, a personalidade e o pensamento
2.1. Ou seja, os seus personagens devem ter uma razão lógica para serem o que são;
E mais:
2.2. Se algo importante ocorre, você espera que o teu herói continue sendo o mesmo do início do livro? Deverá mudar algo, uma atitude, uma pedaço de si, um pensamento, uma postura, etc.
3. Forma e Conteúdo
3.1. O conteúdo, a história, ganha forma, é claro, ao escrevê-la. Mas: já percebeu que tem aquele conto ou aquele capítulo que emperra, fica duro, não sai? Está perfeitinho na tua mente, e "sujo" enquanto matéria bruta. Pois bem. Pense uma outra forma de dizer a ideia. Um outro personagem conta, ou uma novidade na hora de estruturar, ou um jeito novo - só teu - de dizer.
O texto, vez em quando, nos exige ser parido com um jeito diferente.
3.2. Vejamos um lindo, genial, caso de sedução sexual/copulação em Memórias Póstumas de Brás Cubas, de - é óbvio - Machado de Assis:
O modo de dizer com o não-dito. Imaginamos o resto (olha a safadeza...).
[Curiosidade: O Nome Brás é uma abreviação de Brasil, Cubas referencia um meio para carregar ouro. Memórias Póstumas do Brasil Rico. Forma de crítica sutil...]
4. Quantidade e Qualidade | do Simples ao Complexo
4.1. Escreveu o livro? Certamente é um livro ruim. Calma. O que faz o escritor não é o ato de escrever. O escritor é, principalmente, um revisador disciplinado. Revisa, revisa, revisa. Apara, corta, coloca, tampa os buracos, melhora. 10, 20 vezes.
Tudo começa ruim, mal-feito, defeituoso. A insistência é o que promove um salto, algo realmente bom, uma qualidade nova a partir do acúmulo de mudanças. Perceberá quando ocorrer.
5. Necessário e Desnecessário
Não é preciso explicar. Mas podemos acrescentar algo: na trama, algo inútil pode ser desenvolvido para que se torne essencial. Ou aquilo que o leitor despreza e no final - nossa! - faz a diferença.
6. Aparência e Essência
Os termos explicam que a aparência, quase sempre, mente. Quer dizer, quando vamos investigar algo a fundo percebemos que era o contrário do que imaginávamos. Quantas vezes já passamos por isso? Quantas vezes fomos enganados e manipulados? Chegou a hora de manipularmos as sensações do leitor, ele agradecerá. Podemos também contar a história sem uma noção clara de realidade, por um ponto de vista particular (da criança, do inimigo, de Deus, da xícara-de-chá).
7. Concreto e Abstrato
Se o escritor gosta de esquemas, jornada do herói: beleza. Está pegando abstrações, modelos. A tarefa, portando, neste caso, é colocar a carne, a vida própria e a criatividade (sempre). Produzir até o modelo-esquema ficar invisível, diluído, na base. Assim, o futuro leitor não achará em ti a mera imitação de outras obras. Também - e é algo belo - pode-se criar muito mais livremente ou subverter, ou descartar, ou alterar este e aquele elemento.
8. As combinações geram o novo
Chama-se, tecnicamente, "lei do desenvolvimento desigual e combinado". Resumindo (por falta de espaço/tempo): algo novo, da criatividade, surge da cominação de informações diferentes. Por isso, é importante ler, ter grandes experiências, praticar e, de novo, ler, ler tudo (de qualidade).
Daí virá a criatividade. Tua mente combinará informações permitindo o surgir de novas. O processo de combinação pode ser também - e inclusive - consciente.
É isso. Bom dia do trabalhador e bom dia das mães.
Nesse blog publicarei cada novo conhecimento que eu adquirir. Não fará o perfil guru ou orientador. Ao contrário. Por isso, vamos falar hoje sobre métrica em letras de música. A muito tempo procuro aprender a usar e errei (erro) muito. Finalmente (!) desenvolvi um conhecimento seguro sobre.
Vamos começar pela coisa e depois explico a coisa.
Antes, um breve resumo sobre como ler as sílabas poéticas:
1) Não se contam as sílabas poéticas que estejam após a última sílaba tônica do verso.
2) Ditongos têm valor de uma só sílaba poética.
3) Duas ou mais vogais, átonas ou até mesmo tônicas, podem fundir-se entre uma palavra e outra, formando uma só sílaba poética.
[wikipedia]
Confuso? Se não entendeu sobre isso ainda: calma. Temos tempo.
Dica: a poesia e as poesias enquanto letra de música são organizadas focando a palavra falada, não a escrita.
Exemplo: Minha alma. Quando vamos falar ou ler, a realidade nos faz dizer desta forma aqui: Minh'alma ou minhalma. Há uma fusão, uma crase.
Fiz a "escanção" da linda música La Belle de Jour, de Alceu Valença.
Por que ela é tão bela e fluida? Uma das respostas a seguir, a primeira estrofe:
"Eu lembro da moça bonita
Da praia de Boa Viagem
E a moça no meio da tarde
De um domingo azul"
Leia sem cantá-la. Da escanção descobrimos a métrica e o ritmo da letra:
Eu | LEM | bro | da | MO | ça | bo | NI | ta | da | PRA | ia | de | BOa | Vi | Agem
Vejamos a relação entre os sons fortes (TUM) e sons fracos (tim).
tim TUM tim tim TUM tim tim TUM tim tim TUM tim tim TUM tim TUM
_
Continuando:
E a |MO | ça | no | ME | io | da | TAR | de de um | do | MIN | go a | ZUL
Igual:
tim TUM tim tim TUM tim tim TUM tim tim TUM tim tim TUM Tim TUM
Detalhe: nesse caso o de-de, pela relação sonora e a rapidez, é considerado uma fusão. São versos diferentes cantados na mesma carreira pelo cantor.
A composição toda manipula as sílabas poética átonas e tônicas:
fraco FORTE fraco fraco FORTE fraco fraco FORTE fraco FORTE
E segue sempre mais ou menos nesse formato.
O que para um ouvinte é talento, para o letrista e poeta é talento e técnica.
A musicalização da letra aproveita isso e permite harmonização e efeito.
A poesia e as letras de música usam esta técnica basicamente no mesmíssimo formato. Assim a relação sílabas fortes e fracas geram diferentes ritmos, efeitos e sensações.
Os versos da música começam com uma sílaba átona e uma tônica - jambo ou: fraco FORTE. Continuam com uns Anapestos - duas sílabas átonas e uma tônica ou: fraco fraco FORTE. E terminam com outro jambo: fraco FORTE.
O nome original é "pés", pois os poetas guiavam as palavras com a batida dos pés enquanto tocavam suas violas medievais.
Vamos ver um ótimo caso de anapesto.
A música Geleia Geral, do tropicalista e poeta marginal Torquato Neto.
"Um poeta desfolha a bandeira
E a manhã tropical se inicia
Resplendente, cadente, fagueira
Num calor girassol com alegria
Na geleia geral brasileira
Que o jornal do Brasil anuncia"
1 2 3 4 5 6 7 8 9
Um |po | E | ta | des | FO | lha a | ban | DEI | ra
E a | ma| NHÃ |tro | pi | CAL | se i | ni | CIA
Res | plen | DEN| te, | ca |DEN | te, | fa | GUEI | ra
Num | ca | LOR | gi | ra | SSOL | com a | le| GRIA
Na | ge|LÈ| ia | ge | RAL | bra | si | LEI | ra
Que o | jor | NAL| do | Bra | SIL | a | nun | CIA
Três unidades: fraco, fraco, FORTE. Do começo ao fim.
Contando até a última sílaba tônica, estamos diante de versos eneassílabos, nove sílabas poéticas. Como trabalhar os tipos de versos, quem sabe, será tema de outro post.
Para encerrar, dois exemplos de ritmo belos. Um troquel ou: FORTE fraco. E outro com jambo: fraco FORTE. Os dois casos procuram estimular a subjetividade ao simular a sonoridade de um trem:
"Muita força Pouca Terra
Muita ForçaPouca Terra"
- Poeta Da Costa e Silva
"Café com Pão
Café com Pão"
- Poeta Manuel bandeira
Qualquer coisa, fica a vontade para comentar. Que tal tentar compor usando a proposta da técnica?
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João Paulo da Síria